domingo, 6 de maio de 2012

“Não confie em ninguém com mais de 30 anos!”


Evocar uma das frases lemas do Maio de 1968: “Não confie em ninguém com mais de 30 anos!”, pichada em muros, gritada em passeatas e barricadas, não tem o intuito de relacionar o movimento jovem/estudantil que estamos vivendo agora em Blumenau com as manifestações da década de 1960 pelo mundo afora, em especial no Brasil. De fato, ao acompanhar as discussões e as passeatas ‘Contra o Aumento do Passe de Ônibus’, ‘FURB Federal’, ‘Pró-Ciclovias’ e manifestações de crítica à gestão cultural da cidade, foram as descontinuidades que me instigaram a pensar/entender esse jovem. Pois, em relação às premissas do movimento estudantil vivenciado em Blumenau (Brasil) em décadas anteriores, notam-se muitas mudanças, tanto que os Centros Acadêmicos e DCE/FURB vivenciam profundas crises de gestão e identidade. 

Algo peculiar aos recentes movimentos realizados em nossa cidade foi a rejeição à tutela político-partidária, e olha que não faltaram ‘candidatos’ a ocupar o papel de tutores. Ao contrário daqueles que pensaram/pensam que em um partido político está a ‘salvação’ ou mudança para uma realidade mais justa, esse jovem compreende que um partido de direita, centro ou esquerda é mais do mesmo; um sistema de conformação às regras e interesses de poder e financeiros de uma minoria dirigente do Partido. Para ele, ser tutelado pelo movimento jovem de qualquer partido é se calar e conformar a esses interesses. Entre os diversos Partidos ainda há uma política de arregimentação, em que o jovem é pensado como o aprendiz, aquele que representa uma continuidade partidária, não há interesse em ouvi-lo ou possibilitar que sua compreensão de mundo seja debatida. Porém, hoje essa estratégia de cooptação de votos e o fingimento de uma participação política é duramente contestada e manifestada pela rejeição total às siglas e instituições. 

E a resposta dada a estes jovens que contestam o modelo de participação política na sociedade, que se diz organizada, tem se mostrado uma só: Baderneiros! E o brado vem das mais diversas direções, siglas e indivíduos que se mostram atônitos diante dos jovens que recusam o status e o conforto oferecido pelas instituições. 

Foto: Jaime Batista da Silva
Vamos Parar Blumenau!

Parar ou movimentar? A cidade é sempre tão parada... Mas o cartaz sobre o pára-brisa do ônibus expõe uma realidade compartilhada por todos, porém dificilmente expressada: mais do que movimentar é preciso parar a cidade. Parar o fluxo contínuo de carros e pedestres zumbizados em seu ir-e-vir: casa/televisão – trabalho/estudo – casa/televisão. Pessoas amortecidas em sua rotina. Exasperadas diante daqueles que ousaram questionar a sua tênue ilusão de um mundo perfeito onde os carros fluem, o trabalho dignifica o homem, a cerveja de sexta-feira é uma certeza, os jornais denunciam os criminosos, as novelas têm finais felizes, os ciclistas e artistas não estão na contramão e as praças estão desertas. 

Esses baderneiros, ao pararem a ‘cidade’ causaram desconforto, não pelas suas reivindicações, mas porque atrapalharam a rotina cinza da cidade. Instigaram dúvidas? Sim, mas logo depois foi deixado de lado em prol do restabelecimento da ordem/rotina: a tarifa de ônibus aumentou, a FURB não foi federalizada, os ciclistas continuam sem ciclovias e a gestão cultural da cidade só piorou. 

Por que os protestos não continuaram? 

Diferentemente dos movimentos estudantis/sociais/políticos que os precederam, esses jovens não buscam conduzir a sociedade à salvação. Contestam-na sim, mas, para além de se enquadrar no imaginário estabelecido do ‘herói marginal’, esse jovem percebe a necessidade de criar ‘outras margens’. E, sempre que estas margens se estabelecem na sociedade, ele dá mais um passo adiante no precipício. Para ser esse novo marginal é preciso estar em queda livre, a margem está além dos espaços/limites, esta margem é anti-cartográfica. 

A ética/estética de existência desses jovens se constitui em fazer da sua vida uma contínua contestação das normas estabelecidas. Podemos falar em desobediência civil, porém, muito mais do que se negar a cumprir leis injustas, questiona-se todo o modo de vida na modernidade e os fascismos cotidianos contidos nas verdades e rotinas. 

Esse baderneiro mostra aquilo que o oprime e incomoda na sociedade contemporânea, mas entende que mudar é um ato do indivíduo; pois dizer verdades sobre como a vida deve ser vivida em nada difere das atitudes anteriores, como a de conduzir um rebanho – seja através de partidos políticos ou movimentos de igrejas. De fato, esse baderneiro não pretende ser condutor, nem conduzido.

Um elogio aos jovens? Sim, mas não a todos, que fique claro. Um elogio àquele jovem/adulto/velho que ousa pensar um mundo para além da lógica capitalista, dos governos e sujeição perpetuada pelas instituições políticas, educacionais e religiosas. Àqueles que dão novo sentido ao adjetivo: marginal. Um elogio àqueles que criam às novas margens, desvinculadas de qualquer instituição. Àqueles que estão em queda livre! 

Artigo publicado no Jornal Expressão Universitária - abril/2012, p. 16: 
http://www.sinsepes.org.br/expressao/Expressao_27_abril_2012_INTERNET.pdf